domingo, 7 de setembro de 2014

Ordem e Caos na Arteterapia

Ordem e Caos: um diálogo através da construção de Mandalas


Segundo Sonnerborn e Kessler (2013), por ocasião da exposição no Congresso na Eidgenössische Technische Hochschule, Jung foi fotografado com o indicador de uma das mãos diante de um Mandala apontando para o centro, referindo-se à função arquetípica do Self de conduzir ao centro. Nise destaca e comenta a foto: “Este é um gesto que por assim dizer resume a psicologia junguiana: apontar para o centro, o Self, simbolizado pela Mandala. O Self é o princípio e arquétipo da orientação e do sentido: nisso reside sua função curativa” (SILVEIRA, 1981, p. 52-53).


Processo de Individuação

            Para Jung, o processo de individuação é natural, inerente ao ser humano, podendo ser entendido como uma “[...] tendência instintiva a realizar plenamente potencialidades inatas” (SILVEIRA, 2003, p. 77-78).
Pode-se ver na obra de Jung diversas passagens em que o processo de individuação é expressivamente relacionado às Mandalas.
            Segundo Nise da Silveira (2003), no curso do processo de individuação, em torno desse centro e em função dele, vêm organizar-se os diferentes fatores psíquicos e mesmo os mais irreconciliáveis opostos... Cria-se uma ordem que “transforma o caos em cosmos”.
Jung (2012) acumulou informações por dez anos, antes de publicar em 1929, pela primeira vez sobre o tema, conceituando Mandala como:
Uma imagem cuja existência é verificável através de séculos e milênios. Designa a totalidade do Si-mesmo.[...] A Mandala visa à unidade, isto é, representa uma compensação da cisão, isto é, sua superação antecipada. (JUNG, 2012, p. 289).
Sonnerborn e Kessler (2013), D. destacam que Jung (2011a) constatou que em muitos de seus pacientes o símbolo da Mandala surgia espontaneamente, em sonhos, fantasias, desenhos, tanto em momentos de crise como durante o processo de análise, evidenciando equilíbrio e ordem, e assim, percebeu que se tratava de manifestações do Self, enquanto totalidade organizadora do indivíduo.
Na natureza, em condições de turbulência aparecem fenômenos espontâneos de organização. É o que também acontece em processos psíquicos com a tentativa de auto organização das desordens mentais, que podem ser expressas e até promovidas pelas manifestações artísticas.
Entre estas, segundo Jung (2011a), a pintura espontânea de Mandalas - representações concentricamente dispostas – é uma busca inconsciente da reorganização psíquica.
O trabalho de Nise da Silveira, no Museu do Inconsciente, foi resultado de observação, pesquisa, estudo e posteriores contribuições do próprio Jung, para quem Nise escreveu e remeteu algumas fotografias dos desenhos de dos seus pacientes, que denotavam complexidade e harmonia, aproximando-se aos desenhos de Mandalas contidos nos textos de religiões orientais. Jung os reconhece como Mandalas, as quais “davam forma a forças do inconsciente que buscavam compensar a dissociação esquizofrênica” (SILVEIRA, 1981, p.52).
Às questões de como tais produções poderiam ser interpretadas, Jung responde com perguntas como: “– Qual o significado do desenho para o autor, quais os sentimentos que desejava exprimir ao desenhá-los?”, destacando que os autores deveriam ser questionados sobre os sentimentos que as Mandalas lhes evocavam (SILVEIRA, 1981).
Nise e Jung perceberam o potencial do simbolismo da Mandala na psique, tanto como um recurso integrador como tentativa de busca e conexão com o Self.
De acordo com a concepção oriental, o símbolo mandálico não é apenas expressão, mas também atuação. Ele atua sobre seu próprio autor. Oculta-se neste símbolo uma antiquíssima atuação mágica, cuja origem é o “círculo de proteção”, ou “círculo encantado”, cuja magia foi preservada em numerosos costumes populares (JUNG; WILHELM, 2011).
“A Mandala possui uma eficácia dupla: conservar a ordem psíquica, se ela já existe; reestabelecê-la, se desapareceu. Nesse ultimo caso, exerce uma função estimulante e criadora” (CHEVALIER & GHEERBRANT, 2006, p.585-586).

Confecção de Mandalas na Arteterapia

Toda situação nova é, do ponto de vista da consciência, um caos a ser ordenado, o que pode gerar medo, ansiedade e angústia frente ao desconhecido.
Segundo Bernardo (2008), na Arteterapia, a confecção de Mandalas é uma atividade especialmente indicada para facilitar a abertura ao novo sem grandes angústias, bem como o acesso e a integração de novas possibilidades à consciência, ampliando-a.
No processo de confecção de uma Mandala, cria-se um círculo que atua em nossa psique como a configuração de um espaço integrador, análogo a um ventre, a um vaso, que corresponde ao que algumas culturas indígenas chamam de “espaço sagrado” ou “vaso mágico” (BERNARDO, 2008).
Simbolicamente, nos diz Bernardo (2008) que esse espaço corresponde ao nosso mundo interno, no qual acolhemos e trabalhamos com as nossa vivências, sentimentos e ideias, que é como um caldeirão em que acondicionamos e germinamos as sementes do novo, transformando nossas vivências em alimento de nosso crescimento psicológico.

Referências Bibliográficas

BERNARDO, Patricia Pinna, A Prática da Arteterapia: Correlações entre temas e recursos, volume I – Temas centrais em Arteterapia; Editado pela autora; São Paulo, 2008.
CHEVALIER, J.; GHEERBRANT, A. Dicionário de Símbolos. 20ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2006.
JUNG, C.G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo: obra completa. V. 9; 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2011 a.
______. Memórias sonhos reflexões. 23. ed. São Paulo: Nova Fronteira, 2012.
JUNG, C.G.; WILHELM, R. O segredo da flor de ouro: um livro de vida chinês. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2011.
SILVEIRA, Nise da. Imagens do inconsciente. 4. ed. Brasília: Alhambra, 1981.
______ Jung. (Coleção Vida & Obra); 19ª edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.
SONNEBORN, D., KESSLER A.S. Mandala: um símbolo do processo de individuação., 2013 disponível em http://portal.ulbratorres.com.br/revistas/documentos20132/4.pdf, Acesso em março 2014.


Fonte: Texto fornecido pela Ana Alice Turbianelli

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